domingo, 25 de janeiro de 2015

Esta semana recebi um telefonema interessante.  Que me fez voltar atrás no tempo, aos dias em que o meu salário vinha com mais zeros no final de cada mês.  Que chegava para a minha casa e para outras casas que precisavam de apoio.  Que me podia dar ao luxo de dar, sem me fazer falta.  Que entre um pedido de ajuda e a compra de uns sapatos novos, eu optava sempre pela primeira escolha, sem pensar duas vezes.  Os sapatos chegariam depois, isso era sempre certo.
Esta semana recebi um telefonema da Unicef.  Estranhei.  De início pensei até que seria um qualquer questionário estatístico, mas logo vi que me tinha enganado.  Queriam saber porque motivo eu, que sempre os tinha ajudado durante tanto tempo, deixara de aparecer em forma de cheque.  Ou de transferência bancária.  
Esta semana fiquei, uma vez mais, admirada com as pessoas.  E com as instituições.  Ainda respondi à menina que a minha vida tinha mudado um pouco (muito!!!) e que tinha deixado de poder ajudar.  Pelo menos da forma que o fazia antes.  
Esta semana voltei a lembrar-me das palavras de Augusto Gil  - "(...) Mas as crianças, Senhor, porque lhes dais tanta dor?  Porque padecem assim?" 
E pensei, de mim para mim, que até hoje nunca recebi nenhum telefonema da Unicef a agradecer o meu apoio...

domingo, 18 de janeiro de 2015

A história deles é longa de décadas.  De quase quatro décadas. 
Conheceram-se no final dos anos setenta, numa altura em que o país se ajustava aos novos ventos de abril e os jovens iam descobrindo um mundo novo.   Para eles, abril também significou mudança e nunca mais nada foi igual.
Desde o dia em que se conheceram naquela viagem de estudo e durante muitos meses eles foram a vida um do outro.  Para ela a vida não tinha significado sem ele, para ele nada acontecia se ela não participasse.   Passaram a ser o vício um do outro, o dia, a tarde, o tempo de estudo e o outro, o dos abraços e beijos.  Todo o tempo era pouco para estarem juntos.  E, na despedida, era o até logo em vez do adeus e todos os minutos passavam em contagem decrescente até ao próximo reencontro.
Um dia não foi mais assim.  O orgulho falou mais alto que o amor e, em vez de adeus, disseram "nunca mais" e isso deixou-os de mãos vazias e coração triste.
Passou tempo.  Muito tempo, mesmo.  De todas as vezes que ela ouvia a expressão "nunca digas nunca", era dos olhos dele que se lembrava e do abraço que não chegou a receber.  As memórias daqueles meses acompanharam-na e a ele, durante o caminho que fizeram. 
Depois disso muitas histórias aconteceram na vida deles. E na do mundo, também...
Hoje estão de novo juntos. 
O "nunca mais" passou a ser um "para sempre".  E este significa até nunca mais ter fim, que é como quem diz, enquanto eles o quiserem...

sexta-feira, 9 de janeiro de 2015

Quase todos os dias passo por ela.  Pela rapariga que espera junto à esquina.  Acontece, nesses dias, encontrarmos-nos no mesmo momento, no mesmo lugar.  Cada uma no seu destino.  Eu caminhando apressada no meu regresso a casa onde a vida me espera.  Ela parada na esquina, quem sabe esperando que a vida a venha buscar.
No outro dia sorri-lhe.  Ainda vinha longe e já sentia os seus olhos a observar-me, como acontece quase sempre.  Parecia que me estava a medir, a calcular a velocidade dos meus passos, a ondulação que o vento provocava no meu cabelo, a forma como eu apertava o casaco para escapar ao frio.  Ela não correspondeu ao meu cumprimento.  Continuava a olhar-me, mas como se eu não existisse.  Como se visse através de mim.
Porque espera todos os dias naquele local?  Por quem espera?  
Ao longe parece jovem, mais perto percebo que já não é tão nova assim.  Nota-se que o tempo passou por ela, enquanto esteve parada naquela esquina, esperando...
Um destes dias vou meter conversa com ela.  Tentar, pelo menos.  Ao fim e ao cabo, o nosso tempo é o mesmo tempo e, quem sabe, talvez possamos esperar juntas ou caminhar lado a lado tornando essa espera mais fácil...

quarta-feira, 7 de janeiro de 2015

Passou depressa este ano, quase nem dei conta...
Juntos vivemos 12 meses, 52 semanas, 365 dias, milhares de horas, de momentos, de abraços, de beijos.
Juntos percorremos quase 30 mil quilómetros.  Centenas de viagens de ida e volta, pouco faltou para darmos a volta ao mundo, na medida da linha do equador.
Juntos falámos sobre todos os assuntos, dissemos e ouvimos milhares de palavras, entendemos sempre os silêncios que ficam entre elas.
Fomos o adormecer e o acordar um do outro, o dia e a noite, a espera e o encontro, o sorriso e a lágrima, foste o meu abraço, és a minha vida.
Quase não me lembro como era antes, como foi sem ti.  Sei que podemos não ter tido muito tempo no passado, mas o nosso hoje não tem tamanho nem limites.  E os sonhos são mesmo assim, vão aparecendo sonho a sonho, momento a momento.
Feliz ano novo, meu amor! ♥
Cada vez me apego menos aos objectos.  Às coisas, à matéria.  Cada vez me fazem menos falta.  Ocupam espaço, pesam, criam raízes, fazem sombra.  Obrigam-me a pensar neles, olhar por eles, cuidá-los.  Discutir por causa deles, por vezes.  Pô-los à frente dos afectos, nalgumas vezes usá-los em seu lugar.  
Cada dia me sinto mais desprendida.  E isso faz-me pensar que estou aos poucos a despedir-me, a libertar-me.  A colocar cada coisa no seu devido lugar.  E a seguir viagem.  Porque, na verdade, nenhum deles me faz falta.  
Cada vez me apego mais às lembranças.  Às imagens, aos cheiros e aos sons que viajam comigo.  Por mais que o tempo passe, não me liberto delas, fico cativa por livre vontade.  Guardo-as, cuido delas, fazem todas parte do ontem que me trouxe até aqui.  Se tivesse que me separar de alguma, por falta de espaço, seria  muito injusto.  

Estranho?  Não.  Nada estranho.  Como é que vou saber de que memórias vou precisar quando envelhecer?  Quando o tempo for imenso e eu precisar de companhia?  Quando chegar o dia em que os únicos objectos que precise forem uma cadeira e uma janela para ver o sol a desaparecer no mar?

segunda-feira, 5 de janeiro de 2015

Há pessoas assim.  Brincam com a vida como se esta fosse um yo-yo.  Não a levam a sério, não têm a noção da sua fragilidade.  Acham-se imortais, julgam-se mais importantes que o outro que têm ao lado.
Há pessoas que passam o tempo a fazer zapping.  Mudam de estado de alma consoante o vento, consoante a conveniência.  Tanto dão para um lado como para o outro, nunca se fixam e a palavra afecto não lhes diz nada.  Não se apegam a nada, só às suas crenças.
Há pessoas para quem as janelas não servem para lhes mostrar o mundo lá fora.  Os vidros, esses, apenas são usados para se verem reflectidos neles.  Essas pessoas  estão sempre viradas do avesso, para si próprias, a sua realidade existe à volta da palavra "eu" e de outras que com ela rimam.

Há  pessoas assim, pobres de tudo.  Ou ricas de nada.

domingo, 4 de janeiro de 2015

Estar presente é muito mais do que ser visto.  Ou que ser tocado.
É ser sentido quando o outro pensa em nós.  Quando interrompe a corrente de pensamentos e ficamos apenas nós.  Nós e as memórias que de nós tem.  
Estar presente é ser atento e cuidadoso.  É ter corpo, também.  Posso não estar contigo, ao teu lado a ocupar um espaço físico, mas encontras-me aí sempre que pensares em mim.  
É uma promessa, um compromisso, uma forma de estar na vida que aprendi ao ser mãe.  E que só me abandonará quando um dia partir.  Ou não... porque nessa altura, sei que continuarei presente de cada vez que te lembrares de mim.  Prometo.