Era a noite de um qualquer sábado no parque que fica no centro da minha cidade, junto ao rio. Uma noite com muitas nuvens mas amena, própria para quem gosta de passear à chuva e não tem medo de se molhar nem de estragar o penteado. Num banco de jardim aquele homem dormia tranquilamente. Tinha o céu a cobri-lo e as estrelas, as que não se viam mas que eu sabia estarem para lá das nuvens, iluminavam o seu sonho. No chão, ao seu lado, acredito que toda a sua vida estava dentro de uma mochila.
De repente, senti vontade de ser como ele. Não para poder deitar-me num banco de jardim e fazer daquele parque a minha casa. Mas para também guardar todas as minhas recordações numa mochila que conseguisse suportar às costas. E que pudesse abrir e visitar sempre que me apetecesse. Para nunca mais correr o risco de esquecer o que vai ficando no passado e que eu não consigo evitar. Porque não é envelhecer que me assusta, nem ganhar rugas e cabelos brancos. Isso é inevitável, acontece todos os dias e eu aceito bem. O que me atrofia mesmo é saber que posso ir perdendo a capacidade de recordar o que já vivi. Deixar de voltar aos lugares de cada vez que cheiro um perfume que usei no tempo em que lá estive antes ou esquecer a expressão das minhas filhas da primeira vez que as olhei logo a seguir ao nascimento delas ou não conseguir lembrar mais o timbre de voz da avó quando dizia o meu nome, como acontece agora quando fecho os olhos e penso nela. Ou, simplesmente, deixar passar em branco os aniversários e as datas que me tocam dentro. E, pior ainda, nem me chegar a lembrar que me esqueci de tudo isso...
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