segunda-feira, 2 de dezembro de 2013

Ela está sentada numa esplanada a tomar um sumo e a folhear uma revista.  Está distraída, não presta atenção ao que vê,  o seu pensamento está longe e ela não o consegue controlar.  Isto acontece porque ele é livre, pensa, mas a verdade é que ele está preso a um passado que a marcou e que continua a acompanhar os seus dias, ainda que inconscientemente.  Sempre que interrompe um pouco a sua azáfama diária, os seus pensamentos vão parar àquele tempo em que a felicidade e a expressão "para sempre" eram sinónimos.  Como uma espécie de obsessão que a acompanha.  Ao principio revia mentalmente tudo para ver onde tinha errado, o que poderia ter feito para evitar o que aconteceu.  Pouco depois isso passou a ser um vício, mal dava conta o passado voltava e ensombrava-lhe os dias, as horas e o agora ficava sem espaço para ser vivido.  
Foram felizes durante quatro anos.  Agora, à distância, até lhe parecia estranho ter sido tão pouco tempo, para ela tinha sido a vida inteira.  Não conseguia recordar nenhum outro antes dele, também nada havia para se lembrar depois.  Parecia que a sua vida tinha começado e acabado naquele amor.  Não precisavam de fazer planos de futuro porque nenhum deles imaginava o dia seguinte sem o outro.  Iam ficar juntos para sempre.  Pelo menos para ela era assim...
Tinham-se conhecido num jantar de anos de um amigo comum, que apadrinhou a relação e fez de tudo para os ver juntos o mais depressa possível.  Ela ficou encantada com o charme dele, com a voz, com a cultura que demonstrava ter.  Ele, acabado de sair de uma relação complicada, gostou da alegria dela e do encantamento que sentiu que produzia naquela mulher.  Sentia-se amado e respeitado, percebia que se tinha tornado prioritário na vida dela.  E isso era bom.  Muito bom.  Mas não chegava...
Ele era tudo para ela.  De tudo o que ele tinha, ela era apenas uma pequena parte.  Ela amava pelos dois e nem dava por isso.  E achava-se feliz.  
Partilhavam a casa, os dias, os amigos, mas não a vida e os sonhos.  E ela nem se apercebia disso, vivia e sonhava pelos dois.
Um dia ele chamou-a para uma conversa que dizia ser urgente e inadiável.  Ela deixou o trabalho a meio e sentou-se no sofá, pronta para o ouvir.  A conversa, que afinal era um monólogo, durou pouco mais de cinco minutos.  O tempo dela morrer de repente.  A tal relação anterior tinha voltado e ele queria dar-lhe uma nova oportunidade.  Tão simples como isso.  Ela apercebeu-se que tinha acordado de repente do seu sonho, chorou e sofreu pelos dois.
Depois disso já teve convites para sair com amigos, para jantares de aniversário onde se poderia cruzar com pessoas interessantes, mas ela ainda vive naquele momento.  Ele já casou e vai ser pai no próximo mês, mas ela ainda está lá atrás, sentada no sofá a ouvi-lo discursar com a voz que tanto amava.  Ela foi feliz dentro do sonho e não sabe como sobreviver sem ele...
De facto, e como disse alguém antes, os que dizem que o amor é um sonho, são provavelmente aqueles que logo depois afirmam que nos sonhos não se deve acreditar...

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