Gosto de espelhos. Gosto de os usar para me ver, uns dias mais que outros. Nem imagino sequer a minha vida sem eles. E quando me vejo ao espelho, não é só a minha imagem que lá vejo reflectida. Também lá encontro tudo o mais que está ao meu redor e que me emoldura como a paisagem num quadro em que eu sou a figura principal. Espelhos grandes, pequenos, espelhos de aumentar, espelhos côncavos ou convexos, em todos eu estou. Ou a parte de mim que cabe neles.
Mas os espelhos têm, como muitas outras coisas, duas faces. Um lado espelhado que me mostra sempre como os meus olhos me vêem. É o meu primeiro crítico. Esteja com cara de sono, com ar feliz ou com olheiras e a precisar de maquilhagem, ninguém me vê como ele. Mas e o outro lado? O que será que existe do outro lado do espelho? O meu negativo? As minhas costas? O inverso da minha vida?
Um dia vou tentar passar para dentro dele e ver o mundo com os olhos do lado de lá. Perceber como fica a minha imagem por dentro, em que medida encaixo em mim mesma. Será que posso? Ou isso é entrar na intimidade do espelho? Poderá ser invasão de propriedade? Ou será que para lá do lado espelhado e que é os meus olhos, não existe nada? Apenas uma superfície lisa, negra e inútil, como algumas almas que só vêem o óbvio, o que salta à vista. Um dia vou entrar no espelho. E ver o mundo com os olhos dele, dê por onde der.
Sem comentários:
Enviar um comentário