segunda-feira, 3 de novembro de 2014

Gosto de espelhos.  Gosto de os usar para me ver, uns dias mais que outros.  Nem imagino sequer a minha vida sem eles.  E quando me vejo ao espelho, não é só a minha imagem que lá vejo reflectida.  Também lá encontro tudo o mais que está ao meu redor e que me emoldura como a paisagem num quadro em que eu sou a figura principal.  Espelhos grandes, pequenos, espelhos de aumentar, espelhos côncavos ou convexos, em todos eu estou.  Ou a parte de mim que cabe neles.  
Mas os espelhos têm, como muitas outras coisas, duas faces.  Um lado espelhado que me mostra sempre como os meus olhos me vêem.  É o meu primeiro crítico.  Esteja com cara de sono, com ar feliz ou com olheiras e a precisar de maquilhagem, ninguém me vê como ele.  Mas e o outro lado?  O que será que existe do outro lado do espelho?  O meu negativo? As minhas costas?  O inverso da minha vida?  
Um dia vou tentar passar para dentro dele e ver o mundo com os olhos do lado de lá.  Perceber como fica a minha imagem por dentro, em que medida encaixo em mim mesma.  Será que posso?  Ou isso é entrar na intimidade do espelho?  Poderá ser invasão de propriedade?  Ou será que para lá do lado espelhado e que é os meus olhos, não existe nada?  Apenas uma superfície lisa, negra e inútil, como algumas almas que só vêem o óbvio, o que salta à vista.  Um dia vou entrar no espelho.  E ver o mundo com os olhos dele, dê por onde der.

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