domingo, 2 de fevereiro de 2014

Na sala a lareira acesa aquecia as conversas e o ambiente.  Sentada no sofá, observava o crepitar das chamas e sentia-me em casa.  Como sempre acontece, a visão do fogo produz em mim um efeito quase mágico.  Era a primeira vez que os visitava.  Tinhamos estado a jantar juntos, num restaurante, para comemorar o meu recente emprego e a minha vinda para esta cidade.  Quando os deixei em casa não resisti ao convite para entrar e acabar as conversas que estavam a meio.  Falámos da casa, que era fantástica, do cão de guarda que dormia no jardim e nem deu por nós, dos netos que enchiam os espaços com brincadeiras em outros dias.  Falámos de afectos, de memórias, de saudades.  Sobretudo da saudade que hoje sentem dos filhos e netos que vivem longe  e que só vêem de vez em quando.  Têm de manter vivas as recordações, disse-lhes eu, é o truque que uso quando a saudade aperta.  Só assim consigo enganar a distância, iludir a falta.  E de repente, como que a comprovar isso mesmo, a sala ficou cheia de risos infantis.  Pela minha frente passaram duas crianças a correr, ao mesno tempo que uma outra mais velha, sentada ao meu lado no sofá, lia uma história em voz alta.  Chamava-se "a princesa e a ervilha", também a conheci de um outro tempo e a contei às minhas filhas.  E isso fez-me sorrir.  Naquela noite, naquele espaço, estiveram juntas muitas infâncias.  Os netos e os filhos daquele casal, as minhas próprias filhas, eu mesma.  Rimos e cantarolámos em conjunto, jogámos à macaca e à apanhada e, no final, sentámo-nos no chão, em roda, a ouvir a história da princesa que provou que o era graças a uma prquena ervilha.  Naquela noite, naquela sala aquecida pela lareira, a saudade ficou de lado e os afectos ocuparam todo o espaço.  As vidas, várias, que estiveram comigo ali eram tão reais que quase lhes conseguia tocar.  E eu sorri com esse pensamento.  É o truque que uso para afastar a tristeza, iludir a distância e adiar a saudade.

Sem comentários:

Enviar um comentário